
Cachoeira Bahia em 1531, na expedição de Martins Afonso de Souza estava o fidalgo português Paulo Dias Adorno. Que ficou na Bahia para colonizar a região e iniciar o plantio de cana-de-açúcar. Adorno, com Rodrigues Martins, buscou terras à margem esquerda do rio Paraguaçu, de onde poderia entrar e sair sem dificuldades com suas embarcações. No final do século XVI, existiam cerca de cinco engenhos na região. Mais de cem anos depois, em 1693, foi criada a Freguesia de Nossa Senhora do Rosário do Porto da Cachoeira. Que recebia senhores de engenho e comerciantes. Além de ser grande centro açucareiro, nas terras próximas à vila se desenvolveram outras culturas, entre elas a do tabaco (fumo).
Rica e Prospera
No começo do século XVIII. A povoação (localizada entre os riachos Pitanga e Caquende, consolidou um novo centro com a construção de pontes sobre os riachos. Tão rica era Cachoeira que, em 1756, o Rei de Portugal. Resolveu taxá-la em uma vultosa quantia, revertida para a recuperação da cidade de Lisboa, quase totalmente destruída por um terremoto. Exerceu importante papel no processo de interiorização do desenvolvimento para o sertão, pelo Rio Paraguaçu. E se tornou porta de entrada das expedições que iam para o interior. Além de ser o principal porto de escoamento, para Salvador, da produção dos engenhos localizados à beira do rio.
Historicamente, a cidade foi pioneira no movimento emancipador do Brasil. Dali partiram os primeiros gritos de revolta contra a opressão portuguesa e surgiram. Mais tarde, os batalhões patrióticos liderados pelo Barão de Belém (Rodrigo Antônio Falcão Brandão). E Maria Quitéria de Jesus (a mulher-soldado), dentre outras personalidades que se imortalizaram na história nacional. Durante as primeiras décadas do século XIX. Partiram da cidade as lutas armadas contra os portugueses pela Independência do Brasil, o que projetou Cachoeira no cenário da história política baiana e brasileira.
Cachoeira Bahia – Proclamou o Príncipe D. Pedro I
A liderança política da vila se consolidou em decorrência das lutas pela Independência. Em junho de 1822, antecipando o Grito do Ipiranga, Cachoeira proclamou o Príncipe D. Pedro I como Regente, e foi a sede do Governo Provisório do Brasil. Paralelamente ao desenvolvimento econômico da vila, crescia sua importância política e, algum tempo depois, o local recebeu as visitas de D. Pedro I e D. Pedro II, da Princesa Isabel e do Conde D’Eu.
Criada em 1832, a Vila de Cachoeira Bahia foi elevada à categoria de cidade em 1837. Neste mesmo ano, a cidade foi sede do Governo. mais uma vez, por ocasião da Revolta da Sabinada. (liderada por Francisco Sabino Álvares da Rocha Vieira, entre 1837 e 1838). Provocada pela insatisfação com o governo regencial que se instalou no Brasil, após a Independência. A população reivindicava maior autonomia e o federalismo republicano, sistema que daria mais autonomia política e administrativa às províncias. A cidade recebeu o título de “Cachoeira, a Heroica” por lei publicada em 1837, em virtude dos seus feitos.
Cachoeira Bahia século XIX
Nos primeiros séculos de sua criação, o comércio cresceu rapidamente tornando Cachoeira Bahia a Cidade. mais rica, populosa e uma das mais importantes do país. Posição que manteve até meados do século XIX, tendo o açúcar como um dos alicerces de sua economia. São deste período as construções mais relevantes do seu acervo arquitetônico. No final deste século, quando a primeira crise econômica se abateu sobre o município, Cachoeira chegou a perder um quarto da sua população. A partir de 1924, uma nova crise atingiu a cidade causada pela falta de movimento no seu porto. Devido aos problemas da agroindústria fumageira, agravados com a reestruturação do sistema viário estadual.
Por volta de 1940, Cachoeira Bahia entrou em uma fase de grande decadência, perdeu a sua importância e sofreu um sério processo de isolamento. Com o desenvolvimento do transporte rodoviário, a ferrovia se tornou obsoleta e o transporte fluvial. Fator preponderante na importância econômica, durante muito tempo – decaiu tanto que chegou a ser suspenso. Crises se sucederam na área da indústria do fumo e fábricas foram fechadas. Enquanto as respectivas lavouras perdiam, para outras regiões do país, a posição de liderança que ocuparam por mais de dois séculos.
Cachoeira Bahia – “Primeira Capital”
Uma escuna militar com 26 marinheiros portugueses estava fundeada no rio Paraguaçu. Principal rota fluvial entre o Recôncavo Baiano e a Baía de Todos os Santos, com os canhões apontados para a Vila de Cachoeira Bahia. As ameaças não dissuadiram os principais líderes políticos da vila, que em junho de 1822. Decidiram afrontar os portugueses e a aclamar Dom Pedro de Alcântara como. “Regente constitucional e defensor perpétuo do Brasil”. A retaliação não tardou e a vila foi alvejada por uma saraivada de tiros e balas de canhão.
O episódio, que completou 200 anos dia 25 de junho, marcou o início de uma “Bahia brasileira”. E desencadeou a guerra pela Independência no Estado. Que opôs os portugueses e os nascidos no Brasil em uma série de batalhas. Que acabaram com a vitória brasileira em 2 de julho de 1823.
Recôncavo da Bahia
“Cachoeira foi a primeira capital brasileira da Bahia. Enquanto Salvador ainda era uma capital portuguesa e submetida a Lisboa. Cachoeira formou um conselho interino que passou a governar a província”, afirma o historiador Sérgio Guerra Filho, professor da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia. A aclamação de dom Pedro respondia a uma consulta feita pelos deputados que representavam a Bahia nas cortes de Lisboa. O documento chegou com atraso ao Brasil e, por isso, “estava muitos graus abaixo da temperatura política na Bahia”. Como aponta o historiador Luís Henrique Dias Tavares (1926-2020).
Recôncavo Baiano
O ponto de ebulição foi atingido em Fevereiro. Quando o brigadeiro português Inácio Luís Madeira de Melo virou governador em armas da Bahia sob forte resistência. Um levante foi sufocado pelas tropas portuguesas, que assassinaram a abadessa Joana Angélica no Convento da Lapa. O triunfo português em Salvador fez com que os revoltosos buscassem abrigo no Recôncavo Baiano, onde organizaram a resistência ao comando português na província.
O período entre fevereiro e junho de 1822. Marcado por articulações políticas, pela defesa de um centro de Poder Executivo no Brasil liderado por Dom Pedro. E pela compra de armas, munição e pólvora. Assim, quando a canhoneira portuguesa aportou no rio Paraguaçu. Trancando a entrada e saída de embarcações do porto de Cachoeira Bahia, os brasileiros estavam prontos para resistir.
Celebração e Insurreição
A aclamação a Dom Pedro na Câmara Municipal foi comemorada em uma missa em ação de graças na Igreja Matriz de Cachoeira. Em celebração conhecida como Te Deum. Ao fim da cerimônia, foram disparados os primeiros tiros. Além das balas de canhão que vieram da escuna, portugueses que moravam na cidade também reagiram, entrincheirados. Com tiros de armas de fogo contra aqueles que celebravam a insurreição nas ruas e praças de Cachoeira Bahia.
Um dos atingidos foi Manoel Soledade, personagem cuja participação na batalha ainda hoje é um mistério. Na versão mítica, eternizada em 1931 no quadro do artista Antônio Parreiras. Manoel teria sido o responsável pelo toque do tambor das tropas brasileiras e tombou ao solo sob o instrumento.
Manoel Soledade
O historiador cachoeirano Cacau Nascimento diz que não foi bem assim: “Manoel Soledade era um intelectual negro, uma figura influente. Ele recebeu um tiro após sair da missa e ficou ferido, mas não teve participação militar nas batalhas.” Os brasileiros reagiram para tentar neutralizar o ataque das forças portuguesas e instauraram uma Junta Interina Conciliatória e de Defesa. Embrião do que a partir de Setembro se consolidaria em um governo paralelo da Bahia.
O clima de guerra instaurou-se na vila. A embarcação portuguesa seguiu atacando de forma violenta, atingindo edificações de Cachoeira. A escuna canhoneira só foi tomada em 28 de junho. Quando uma bandeira branca subiu na embarcação cercada por uma flotilha improvisada com canoas e saveiros. Capitão e marujos foram presos e enviados à cadeia pública de Inhambupe, vila do sertão baiano.
A Escolha de Cachoeira Bahia
A Junta de Defesa recebeu adesões de Santo Amaro e São Francisco do Conde e passou a ter pretensões mais amplas. O governar a província e preparar a tomada de Salvador, ainda sob jugo português.
A escolha de Cachoeira como centro da resistência foi natural. A vila era estratégica por causa do porto, que escoava a produção de fumo, couro e algodão. Tinha na época cerca de 20 engenhos de cana-de-açúcar que se mantinham com a força de trabalho escravo. O enfrentamento aos portugueses uniu comerciantes, coronéis, proprietários de terra e donos de engenho. Que escalaram escravizados para formar parte das tropas que partiriam para cercar a capital.
Um Brasil livre
“Foram vários grupos que se unificaram para a resistência. Mesmo com interesses conflitantes, eles se uniram em torno de um Brasil livre. Afirma Luís Antônio Costa Araújo, historiador e provedor da Santa Casa de Misericórdia de Cachoeira. O interesse por maior autonomia se transformou em um nacionalismo que levou parte dos líderes a trocar sobrenomes lusitanos por outros. Com referências nativas, como Baiense, Baitinga, Morici, Baraúna, Pitombo, Tanajura, Gê Acaiaba e Dendê Bus.
Entre junho e outubro de 1822, foram criados em Cachoeira batalhões patrióticos. Formados principalmente por brancos pobres, negros libertos e negros escravizados enviados pelos seus senhores. Os Voluntários da Vila de São Francisco e os Voluntários do Príncipe Dom Pedro, cujos soldados ficaram conhecidos como “periquitos” pelo fardamento verde.
Maria Quitéria de Jesus – Heroína de Guerra
Foi deste batalhão que participou uma das principais heroínas da guerra. Maria Quitéria de Jesus, uma jovem e exímia atiradora que se disfarçou de homem para ser aceita no batalhão. Proibida pelo pai de se alistar no batalhão, ela vestiu um uniforme do cunhado. Cortou seus cabelos e se apresentou como um homem sob a alcunha de “soldado Medeiros”. Mesmo depois de descoberta mulher, permaneceu no batalhão e lutou nas batalhas em Salvador e na foz do rio Paraguaçu.
O reforço oficial viria nos meses seguintes, quando o Exército Pacificador partiu do Rio de Janeiro com armamentos. 38 oficiais e 260 soldados para reforçar as tropas que conquistariam Salvador em 2 de julho de 1823. Depois de 200 anos, os filhos da terra lutam para preservar o legado da resistência cachoeirena. Seja pela exaltação ao passado de “cidade heroica”, seja pelas tradições dos descendentes de quilombos, inviabilizados ao longo dos últimos dois séculos.
O dia 25 de Junho – “O desafio é Manter a Tradição”
No dia 25 de junho, como acontece desde 2007, Cachoeira passou a ser a capital da Bahia por um dia. Por mais um ano, a cidade vai exaltar a figura do caboclo. Que representa a participação popular nas batalhas contra os portugueses, com desfile cívico, sambas de roda e saudações nos terreiros de Candomblé. “O desafio é manter a tradição. Houve uma carnavalização da data, que caiu em meio aos festejos de São João. A data passou a ser uma coisa mais festiva e menos cívica”, explica o escritor e artista plástico Davi Rodrigues. Que tem nas tradições populares de Cachoeira o centro de seu trabalho.
A Cidade Heróica Cachoeira Bahia
Outro desafio é enfrentar a ruína econômica de uma cidade que saiu do apogeu no século 19. Quando ganhou uma ponte de ferro sobre o rio Paraguaçu, ao declínio no século 20. Com a derrocada do porto, da ferrovia, da indústria do fumo e dos engenhos de açúcar. Mitigar as desigualdades sociais e raciais são um desafio ainda maior em uma cidade com mais de 80% da população negra, boa parte dela pobre. Para a maioria da populaçao. A cidade heróica de Cachoeira Bahia – que com seu casario histórico é considerada Patrimônio Cultural Brasileiro. Deve trabalhar para fazer do seu legado o ponto de partida para transformação econômica e social gerando mais empregos e atraindo mais oportunidades
A Cidade de Cachoeira Bahia ” Um lugar sagrado“.